“Eu passei quatro anos na guerra e nunca
colocaram uma arma na minha cabeça. Aqui, em dois meses eu já passei por isso”.
É o que diz o imigrante sírio Samer Albadin, que se mudou para Fortaleza
buscando refúgio da guerra civil que assola seu país. Mal sabia o que
encontraria na capital cearense.
Albadin chegou a Fortaleza em 2014, e
rapidamente percebeu que a cidade enfrenta um momento complicado na segurança
pública. “Eu não me sinto seguro, acho que ninguém se sente seguro aqui. A
gente precisa evitar lugares que sabemos que são mais perigosos, mas atualmente
todo lugar é perigoso“, reflete.
Esse é um dos relatos que o Tribuna do Ceará
ouviu de estrangeiros de países violentos ou sob conflito que fizeram de
Fortaleza o seu lar. Por mais que os problemas de insegurança sejam diferentes
em cada canto, as percepções de cada um mostram que Venezuela, México, Síria e
Líbano não estão tão distantes de Fortaleza quando o assunto é violência.
Na última semana, a capital cearense ganhou
repercussão mundial com a chacina no Bairro Cajazeiras. O caso jogou luz à crise
na segurança pública do Ceará, onde houve 5.134 homicídios em 2017 – média de
14 por dia.
O que
dizem os imigrantes
O libanês Tony Moussa veio para o Brasil em
2000. Viveu de perto o conflito entre palestinos e israelenses no Oriente
Médio, assim como agora encara a insegurança em Fortaleza.
“Aqui eu já fui assaltado e levei um tiro.
Estava com um amigo no carro e o bandido pediu a chave. Meu amigo ficou nervoso
e não conseguiu tirar a chave. O bandido disparou e pegou na minha perna”,
lembra Moussa.
O imigrante se impressiona como o ato de roubar
é indiscriminado no Ceará. “Não tínhamos problemas com assaltos, o nosso
problema era a guerra. Assalto com arma de fogo é raríssimo, lá o ladrão sente
vergonha de roubar, é um ato vergonhoso. Isso é pela cultura que temos no
Líbano”, explica.
Moussa lamenta o momento que Fortaleza
atravessa. “Infelizmente existem riscos na cidade, é um lugar maravilhoso e
devia ter mais segurança. Entre os dois países, o risco maior é aqui. Lá você
sabia as áreas onde não podia andar, aqui não tem bairros protegidos. Eu gosto
muito de morar em aqui, torço pra essa nuvem passar”.
A mexicana Gabriela Madero conta que vê
similaridade em casos como a Chacina das Cajazeiras, onde 14 pessoas foram
mortas, com o que acontece nos últimos anos em seu país, dominado pelos cartéis
do tráfico. “No México é parecido com esse incidente que aconteceu agora.
Bandos que acabam matando pessoas inocentes em um lugar. São coisas extramente
ruins que o governo não pode deixar passar”, opina.
Mas mesmo no México ela não vê alguns riscos
comuns em Fortaleza. “Aqui sei que não posso andar com meu celular na rua, lá
ainda posso fazer isso”, compara Gabriela, lamentando que a insegurança faça
parte da rotina em alguns países do continente.
“Todos os países têm problemas de
insegurança, uns mais outros menos. Acredito que os brasileiros, como os
latinos, possuem a insegurança naturalizada no dia a dia”, comenta.
O venezuelano Fabrício Perez acredita que
segurança pública de Fortaleza se assemelha ao seu país, que vive forte
violência devido à crise financeira que gerou inclusive escassez de alimentos.
Porém, o imigrante ainda considera a capital cearense mais segura que
Maracaibo, onde vivia.
“Aqui sinto mais tranquilidade. Na
Venezuela, todo assalto é com arma de fogo. Sinto que o risco de perder a vida
é maior lá”, compara Fabrício, que, porém, incorporou em Fortaleza uma
vigilância que mantém em sua terra natal. “Não se pode baixar a guarda, nem
aqui e nem lá”, revela. “Ninguém merece isso”, constata.
Hábitos
alterados
O sírio Samer Albadin, que abre esta
reportagem, também precisou mudar hábitos para se adaptar à dinâmica de
Fortaleza. Quando chegou à cidade, ele foi informado sobre a insegurança, mas
não imaginava que chegasse a tanto.
“Dois homens me pararam em uma moto e
levaram meu celular. Lá nunca tive preocupação em andar na rua, ter que guardar
relógio, anel e cordão. Mesmo na guerra isso não acontecia”, relata o
imigrante, que depois de quatro anos em Fortaleza vê que o problema só piora.
“A gente sente que a insegurança cresceu”.
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